martes, 14 de junio de 2011

Poesia: Fernando Pessoa - Antologia - Parte 10 - NADIE EN PLURAL - Álvaro de Campos - Opiario - Em Portugues y Español - Miguel Ángel Flores traduccion


Open your mind, your heart to other cultures
Abra su mente, su corazón a otras culturas
You will be a better person
Usted será una mejor persona
RM

 
Fernando Pessoa

Portugal

OPIARIO

Ao senhor Mário de Sá-Carneiro
3-1914

É ANTES DO ÓPIO que a minh'alma é doente.
Sentir a vida convalesce e estiola
E eu vou buscar ao ópio que consola
Um Oriente ao oriente do Oriente.

Esta vida de bordo há de matar-me.
São dias só de febre na cabeça
E, por mais que procure até que adoeça,
Já não encontro a mola pra adaptar-me.

Em paradoxo e incompetência astral
Eu vivo a vincos de ouro a minha vida,
Onda onde o pundonor é uma descida
E os próprios gozos gânglios do meu mal.

E por um mecanismo de desastres,
Uma engrenagem com volantes falsos,
Que passo entre visões de cadafalsos
Num jardin onde há flores no ar, sem hastes.

Vou cambaleando através do lavor
Duma vida-interior de renda e laca.
Tenho a impressão de ter em casa a faca
Com que foi degolado o Precursor.

Ando expiando um crime numa mala,
Que um avô meu cometeu por requinte.
Tenho os nervos na forca , vinte a vinte,
E caí no ópio como numa vala.

Ao toque adormecido da morfina
Perco-me em transparências latejantes
E numa noite cheia de brilhantes
Ergue-se a lua como a minha Sina,

Eu, que fui sempre um mau estudante, agora
Não faço mais que ver o navio ir
Pelo canal de Suez a conduzir
A minha vida, cânfora na aurora.

Perdi os dias que já aproveitara.
Trabalhei para ter só o cansaço
Que é hoje em mim uma espécie de braço
Que ao meu pescoço me sufoca e ampara.

E fui criança como toda a gente.
Nasci numa província portuguesa
E tenho conhecido gente inglesa
Que diz que eu sei inglês perfeitamente.

Gostava de ter poemas e novelas
Publicadas por Plon e no Mercure,
Mas é impossível que esta vida dure.
Se nesta viagem nem houve procelas!

A vida a bordo é uma coisa triste,
Embora a gente se divirta às vezes.
Falo com alemães, suecos e ingleses
E a minha mágoa de viver persiste.

Eu acho que não vale a pena ter
Ido ao Oriente e visto a índia e a China.
A terra é semelhante e pequenina
E há só uma maneira de viver.

Por isso eu tomo ópio. É um remédio.
Sou um convalescente do Momento.
Moro no rés-do-chão do pensamento
E ver passar a Vida faz-me tédio.

Fumo. Canso. Ah uma terra aonde, enfim,
Muito a leste não fosse o oeste já
Pra que fui visitar a índia que há
Se não há índia senão a alma em mim?

Sou desgraçado por meu morgadio.
Os ciganos roubaram minha Sorte.
Talves nem mesmo encontre ao pé da morte
Um lugar que ma abrigue do meu frio.

Eu fingi que estudei engenharia.
Vivi na Escócia. Visitei a Irlanda.
Meu coração é uma avozinha que anda
Pedindo esmola às portas da Alegria.

Não chegues a Port-Said, navio de ferro!
Volta à direita, nem eu sei para onde.
Passo os dias no smoking-room com o conde—
Um escroc francês, conde de fim de enterro.

Volto à Europa descontente, e em sortes
De vir a ser um poeta sonambólico.
Eu sou monárquico mas não católico
E gostava de ser as coisas fortes.

Gostava de ter crenças e dinheiro,
Ser vária gente insípida que vi.
Hoje, afinal, não sou senão, aqui,
Num navio qualquer um passageiro.

Não tenho personalidade alguma.
E mais notado que eu esse criado
De bordo que tem um belo modo alçado
De laird escocês há dias em jejum.

Não posso estar em parte alguma. A minha
Pátria é onde não estou. Sou doente e fraco.
O comissário de bordo é velhaco.
Viu-me co'a sueca... e o resto ele adivinha.

Um dia faço escândalo cá a bordo,
Só para dar que falar de mim aos mais.
Não posso com a vida, e acho fatais
As iras com que às vezes me debordo.

Levo o dia a fumar, a beber coisas,
Drogas americanas que entontecem,
E eu já tão bêbado sem nada! Dessem
Melhor cérebro aos meus nervos como rosas.

Escrevo estas linhas. Parece impossível
Que mesmo ao ter talento eu mal o sinta!
O fato é que esta vida é uma quinta
Onde se aborrece uma alma sensível.

Os ingleses são feitos pra existir.
Não há gente como esta pra estar feita
Com a Tranqüilidad. A gente deita
Um vintém e sai um deles a sorrir.

Pertenço a um género de portugueses
Que depois de estar a índia descoberta
Ficaram sem trabalho. A morte é certa.
Tenho pensado nisto muitas vezes.

Leve o diabo a vida e a gente tê-la!
Nem leio o livro à minha cabeceira.
Enoja-me o Oriente. É uma esteira
Que a gente enrola e deixa de ser bela.

Caio no ópio por força. Lá querer
Que eu leve a limpo uma vida destas
Não se pode exigir. Almas honestas
Com horas pra dormir e pra comer,

Que um raio as parta! E isto afinal é inveja.
Porque estes nervos são a minha morte.
Não haver um navio que me transporte
Para onde eu nada queira que o não veja!

Ora! Eu cansava-me do mesmo modo.
Qu'ria outro ópio mais forte pra ir de ali
Para sonhos que dessem cabo de mim
E pregassem comigo nalgum lodo.

Febre! Se isto que tenho não é febre,
Não sei como é que se tem febre e sente.
O fato essencial é que estou doente.
Está corrida, amigos, esta lebre.

Veio a noite. Tocou já a primeira
Corneta, pra vestir para o jantar.
Vida social por cima! Isso! E marchar
Até que a gente saia p'la coleira!

Porque isto acaba mal e há de haver
(Olá!) sangue e um revólver lá pró fim
Deste desassossego que há em mim
E não há forma de se resolver.

E quem me olhar, há de me achar banal,
A mim e à minha vida... Ora! um rapaz...
O meu próprio monóculo me faz
Pertencer a um tipo universal.

Ah quanta alma viverá, que ande metida
Assim como eu na Linha, e como eu mística!
Quantos sob a casaca característica
Não terão como eu o horror à vida?

Se ao menos eu por fora fosse tão
Interessante como sou por dentro!
Vou no Maelstrom, cada vez mais pró centro.
Não fazer nada é a minha perdição.

Um inútil. Mas é tão justo sê-lo!
Pudesse a gente desprezar os outros
E, ainda que co'os cotovelos rotos,
Ser herói, doido, amaldiçoado ou belo!

Tenho vontade de levar as mãos
À boca e morder nelas fundo e a mal.
Era uma ocupação original
E distraía os outros, os tais sãos.

O absurdo, como uma flor da tal índia
Que não vim encontrar na índia, nasce
No meu cérebro farto de cansar-se.
A minha vida mude-a Deus ou finde-a...

Deixe-me estar aqui, nesta cadeira,
Até virem meter-me no caixão.
Nasci pra mandarim de condição,
Mas falta-me o sossego, o chá e a esteira.

Ah que bom que era ir daqui de caída
Pra cova por um alçapão de estouro!
A vida sabe-me a tabaco louro.
Nunca fiz mais do que fumar a vida.

E afinal o que quero é fé, é calma,
E não ter estas sensações confusas.
Deus que acabe com isto! Abra as eclusas
E basta de comédias na minh'alma!

No Canal de Suez a bordo





OPIARIO

Al señor Mário de Sá-Carneiro
3-1914

Es antes del opio que mi alma está enferma.
Sentir la vida que convalece y se seca
Y voy en busca del opio que consuela
Un Oriente al oriente del Oriente.

Esta vida de a bordo ha de matarme.
Son días sólo de fiebre en la cabeza
Y, por más que busque hasta que enferme,
Ya no encuentro el resorte para adaptarme.

En paradoja e incompetencia astral
Yo vivo a rayas de oro mi vida,
Ola donde el pundonor es un descenso
Y los propios goces ganglios de mi mal.

Es por un mecanismo de desastres,
Un engranaje con volantes falsos,
Que paso entre visiones de cadalsos
En un jardín donde hay flores en el aire, sin astas.

Voy oscilando a través de la labor
De una vida interior de encaje y laca.
Creo tener en casa el cuchillo
Con que fue degollado el Precursor.

Ando expiando un crimen en una valija,
Que un abuelo mío cometió con esmero.
Tengo los nervios en la horca, veinte a veinte,
Y caí en el opio como en una cuneta.

Al toque adormecido de la morfina
Me pierdo en transparencias palpitantes
Y en una noche llena de brillantes
Se eleva la luna como mi Destino.

Yo, que siempre fui un mal estudiante, ahora
No hago más que ver la nave que va
Por el canal de Suez conduciendo
Mi vida, alcanfor en el alba.

Perdí los días que ya aprovechara.
Trabajé sólo para tener el cansancio
Que es hoy en mí una especie de brazo
Que a mi cuello me sofoca y ampara.

Y fui niño como toda la gente.
Nací en una provincia portuguesa
Y he conocido gente inglesa
Que dice que sé inglés perfectamente.

Gustaba de tener poemas y novelas
Publicadas por Pión y en el Mercure,
Mas es imposible que esta vida dure.
¡Si en este viaje ni hubo tempestades!

La vida a bordo es una cosa triste
Si bien la gente se divierte a veces.
Hablo con alemanes, suecos e ingleses
Y mi dolor de vivir persiste.

Y pienso que no vale la pena haber
Ido al Oriente y visto la India y China.
La tierra es la misma y diminuta
Y hay sólo una manera de vivir.

Por eso yo fumo opio. Es un remedio.
Soy un convaleciente del Momento.
Vivo en la planta baja del pensamiento
Y me da tedio ver pasar la Vida.

Fumo. Me canso. ¡Ah, una tierra donde, al fin,
Muy al este no fuera ya el oeste!
¿Por qué visité la India que hay
Si no hay India sino el alma en mí?

Soy desgraciado por mi primogenitura.
Los gitanos robaron mi Suerte.
Tal vez ni así encuentre al pie de la muerte
Un lugar que me abrigue de mi frío.

Fingí que estudié ingeniería.
Viví en Escocia. Visité Irlanda.
Mi corazón es una abuelita que anda
Pidiendo limosnas a las puertas de la Alegría.

¡No llegues a Port-Said, barco de hierro!
Gira a la derecha, ni yo sé hacia dónde.
Paso los días en el fumador con el conde—
Un vividor francés, conde de final de entierro.

Regreso a Europa disgustado, y en vías
De llegar a ser un poeta sonámbulo.
Soy monárquico mas no católico
Y me gustaba ser las cosas fuertes.

Me gustaba tener creencias y dinero,
Ser la varia gente insípida que vi.
Hoy, al final, no soy sino, aquí,
En un barco cualquier un pasajero.

No tengo ninguna personalidad.
Destaca más que yo ese criado
De a bordo que tiene una hermosa pose estirada
De lord escocés que ayuna desde hace días.

No puedo estar en ninguna parte. Mi
Patria es donde no estoy. Soy achacoso y débil.
El comisario de abordo es un bellaco.
Me vio con la sueca... y lo demás él lo adivina.

Un día escandalizo aquí a bordo,
Sólo para dar de qué hablar a los demás.
No puedo con la vida, y encuentro fatales
Las iras con que a veces me desbordo.

¡Paso el día fumando, bebiendo cosas,
Drogas americanas que atontan,
Y yo ya tan ebrio sin nada! Dieran
Mejor cerebro a mis nervios como rosas.

Escribo estas líneas. ¡Parece imposible
Que aun teniendo talento mal lo sienta!
El hecho es que esta vida es un huerto
Donde se aburre una alma sensible.

Los ingleses son hechos para existir.
No hay gente como esta para estar hecha
Con la Tranquilidad. La gente arroja
Un centavo y sale uno de ellos a sonreír.

Pertenezco a una clase de portugueses
Que después de haber descubierto la India
Se quedaron sin trabajo. La muerte es cierta.
He pensado en esto muchas veces.

¡Al diablo la vida y la gente que la tiene!
Ni leo el libro de mi cabecera.
Me enfada el Oriente. Es una estera
Que la gente enrolla y deja de ser bella.

Caigo en el opio por fuerza. Querer
Que pase en limpio una vida de estas
No se puede exigir. Almas honestas
Con horas para dormir y comer,

¡Qué un rayo las parta! Y esto al final es envidia.
Porque estos nervios son mi muerte.
¡Que no haya un barco que me transporte
Hacia donde nada quiera que no lo vea!

¡Ahora! Me fatigaba del mismo modo.
Quería un opio más fuerte para ir de allí
Hacia sueños que acabasen conmigo
Y que me arrojase en algún lodo.

¡Fiebre! Si esto que tengo no es fiebre,
No sé cómo se tiene fiebre y se siente.
El hecho esencial es que estoy enfermo.
Esto está consumado amigos.

Vino la noche, Tocó ya la primera
Corneta para vestirse y la cena.
¡Toda una vida social! ¡Eso! ¡Y marchar
Hasta que la gente salga apergollada!

Porque esto acaba mal y ha de haber
(¡Cómo no!) sangre y un revólver allá al fin
de este desasosiego que hay en mí
Y no hay forma de resolver.

Y quien me mira, ha de hallarme banal,
A mí y a mi vida... ¡Ahora! un rapaz...
Y mi propio monóculo hace
Que pertenezca a un tipo universal.

¡Ah, cuánta alma habrá, que ande metida
Así como yo en la Rectitud, y como yo mística!
¿Cuántos bajo el frac característico
No tendrán como yo horror a la vida?

¡Si al menos por fuera fuese yo tan
interesante como lo soy por dentro!
Voy en el Maelstrom, cada vez más hacia el centro.
No hacer nada es mi perdición.

Un inútil. ¡Mas es tan justo serlo!
Pudiera la gente despreciar a los otros
Y, aunque con los codos rotos,
Ser héroe, loco, maldecido o bello!

Tengo ganas de llevar mis manos
A la boca y morder en ellas fuerte y castigarme.
Sería una ocupación original
Y distraería a los otros, los dizque sanos.

Lo absurdo, como una flor de la tal India
Que no vine a encontrar en la India, nace
En mi cerebro harto de cansarse.
Que Dios cambie mi vida o que la acabe...

Que me deje estar aquí, en esta silla,
Hasta que me metan en el cajón.
Nací para mandarín de condición,
Mas me falta el sosiego, el té y la estera.

¡Ah qué bueno sería ir de aquí en caída
Hacia la tumba por una trampa de estruendo!
La vida me sabe a tabaco rubio.
Nunca hice más que pasar la vida fumando.

Y al final lo que quiero es fe, es calma,
Y no tener esas sensaciones confusas.
¡Que Dios acabe con esto! Abra las esclusas
¡Y basta de comedias en mi alma!

A bordo, por el Canal de Suez

 

Poesia: Fernando Pessoa - Antologia - Parte 10 - NADIE EN PLURAL - Álvaro de Campos - Opiario - Em Portugues y Español - Miguel Ángel Flores traduccion





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